sexta-feira, 20 de junho de 2014

Impressões sobre o 8K

Hoje fui assistir ao evento especial promovido pela Rede Globo e pela NHK (Japan Broadcasting Corporation - emissora televisiva estatal do Japão), durante a Copa do Mundo, de demonstração da tecnologia de exibição e transmissão em 8K, chamada de "Ultra High Definition".
Somente para situar o que é esse 8K, hoje o que chamamos de TV Digital no Brasil baseia-se na transmissão e exibição, pelos televisores, de imagem em Full HD ou HDTV (1920 x 1080 pixels). Nas salas de cinema, o padrão mínimo de cinema digital mundialmente é o 2K (2048 x 1080 pixels). Esse 2K nada mais é do que um termo genérico que designa uma resolução na ordem de 2 mil pixels. Entretanto, uma parcela dos cinemas já instalaram projetores 4K - no Brasil, a UCI começou a instalar os primeiros projetores no final de 2010, mas ainda são poucos em todo o país. 4K (4096 × 2160 pixels) designa o que seria o dobro da resolução do 2K, mas é difícil saber quais salas de cinema no Brasil tem 2K ou 4K, já que a divulgação é sobretudo se o filme é em 3D, IMAX (um sistema que abrange ainda uma tela maior) ou se a sala tem atendimento VIP.
Anúncio da Sony 4K nos estádios da Copa
Em relação à TV, ano passado a Sony começou a vender no Brasil suas primeiras televisões 4K e a Copa do Mundo de 2014 tem sido o palco de uma campanha agressiva da empresa japonesa para divulgar esse produto. Entretanto, a Copa de 2014 está sendo transmitida e assistida em grande parte do Brasil em Full HD. Em 4K, somente serão feitas transmissões experimentais.Quem comprar uma TV 4K, não vai assistir nada transmitido no Brasil nessa resolução.
Desse modo, os testes em 8K parecem e são mesmo apenas uma experiência, sem aparente previsão de massificação a curto prazo. Mas no planejamento otimista da NHK, em 2016, nas Olimpíadas do Rio, a empresa pretende fazer as primeiras transmissões experimentais em 8K e, em 2020, de fato televisionar a Olimpíadas de Tóquio nesse novo padrão.
O evento ao qual fui assistir consistiu na exibição de um filme de 30 minutos com imagem e som nesse padrão de Ultra Alta Definição, com filmagens de vários eventos: o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro deste ano, um desfile de modas e um espetáculo de queima de fogos no Japão, trechos da final da Copa das Confederações de 2013 (Brasil x Espanha) e trechos de um jogo da Copa do Mundo que está ocorrendo no Brasil (no caso, do jogo de ontem Grécia x Japão).
Além da maior resolução de imagem, a tecnologia prevê a substituição do sistema de som multicanal (5.1 ou 6.1) por 22.2 canais de áudio. Esse sistema consiste em três faixas horizontais de alto-falantes atrás da tela, cada uma com 3 (mais baixo e mais alto) e 5 (meia altura) canais, além de dois grids de surround, a meia altura (5) e no teto (5 + 1, no centro do teto). Assim: tela (3 + 3 + 5)  e surround (5 + 6) resultam em 22 canais + 2 subwoofers = 22.2.
Os folhetos publicitários destacam as "imagens altamente realistas", a "imersão" do som, e os "impressionantes detalhes". Enfim, as mesmas qualidades que cada nova onda tecnológica apregoa ao longo da história, dos grandes formatos nos anos 1920 até a atualidade, passando pelas telas panorâmicas, pelo som estereofônico e pelas primeiras gerações do som e imagem digital.
A minha impressão pessoal dos filmes é de que se trata, sobretudo, de um ganho de resolução e nitidez. A progressão numérica (2K, 4K, 8K etc.) baseia-se em ter mais pixels na imagem. No início do filme, faz-se uma comparação entre o Full HD e o 8K, quando se mostra um plano geral de uma rua com pedestres. Ao enquadrar um trecho dentro da tela e fazer um zoom, a narração destaca como, nesse caso (no recorte de um detalhe da imagem), o Full HD fica sem nitidez, pixalado, enquanto no 8K não. Isso me parece significativo de que, o 8K, só provoca algum impacto num quadro geral ou num pequeno detalhe.
A escolha do que é mostrado no filme-teste é bastante significativa. No caso do carnaval e do desfile de moda, a opção é por planos gerais que revelem um número enorme de pessoas e detalhes (roupas, adereços, efeitos, texturas) - tudo sempre em foco para revelar a precisão dos detalhes. Nesse sentido, ao se abster do uso da profundidade, as imagens ficam absurdamente nítidas, mas com a impressão de serem chapadas.
Isso me provocou dois efeitos. Por um lado, o excesso desse "tudo-em-foco-e-muito nítido", me causou um certo desagrado. As imagens me pareceram confusas, desequilibradas. No caso do carnaval, outros detalhes desviavam minha atenção das alegorias, dos carros e dos passistas. Meu olhar ia para alguém sem camisa na plateia, para o cinegrafista que se destacava no meio do desfile, para uma pessoa de uniforme no camarote. O excesso de foco provocava uma falta de foco.
Por outro lado, alguns efeitos pareciam mais bonitos, como a chuva de papel picado prateado, que reluziam em todos os cantos da tela. Ou a enorme fumaça rosada e crescente de uma cena do lançamento de um foguete. Me lembrei, curiosamente, do texto de Jacques Aumont (Lumière, o "último pintor impressionista", do livro O Olho Interminável), quando o autor comenta os temas banais dos primeiros filmes do final do século XIX, e a reação dos primeiros espectadores fascinados com a realidade palpável de detalhes como o balançar das folhas pelo vento ou o marasmo do bater das ondas na areia. No caso do filme A Saída dos Operários da Fábrica Lumière (1895) a atração estaria na "generosidade visual" do movimento de inúmeras pessoas, todas diferentes e que não se repetiam. A abundância visual da realidade retratada na tela.
Enquanto alguns aspectos que me desagradam no digital não são solucionados pelo aumento de resolução - a textura da cor, por exemplo, continua fria e feia quando comparada com a película -, noto também esse efeito crescente do fascínio dos detalhes no plano geral.
Me lembrei do impacto que senti quando assisti à animação O corcunda de Notre Dame (1996) em seu lançamento nos cinemas. Esse filme é da primeira geração de desenhos da Disney que incorporava as ferramentas digitais e, na época, foi divulgado o quanto isso teria facilitado as cena gerais com muitos personagens se movendo individual e diferentemente em vários sentidos e velocidades. O número musical Topsy Turvy, por exemplo, abusa justamente das cenas de multidão numa festa popular, com direito até à chuva de papel picado. Até hoje, me parece, o grande avanço das animações (que incorporaram o digital em sua máxima potencialidade) foram no sentido do aparente realismo das texturas e detalhes (folhas de árvore, aparência de madeira ou tecido, pêlos de animais etc.) que, muitas vezes, contrastam com a artificialidade de outros personagens, objetos ou cenários.
Nas cenas dos jogos de futebol em 8K, porém, diferentemente das cenas de carnaval, havia o enquadramento de jogadores em plano americano, com o fundo (arquibancada) fora de foco. Nesses casos, minha atenção acabava indo para detalhes do próprio corpo em evidência: a nitidez do suor no rosto do jogador, na textura da camisa molhada, nos cabelo desarrumado. No campo do som, porém, a questão é menos a existência da tecnologia do que seu uso. Apesar dos 22.2 canais, o som quase todo me pareceu vir dos canais centrais da tela. Apenas na sequência dos fogos de artifício, que subiam aos céus, me chamou atenção o uso das caixas frontais superiores, dando a impressão do som se elevar ou vir de cima, mas, de forma geral, o sistema surround me parece muito pouco explorado frente ao que já ouvi em 5.1, por exemplo.
Nas cenas de futebol, apesar da adoção do mesmo enquadramento geral tradicional na transmissão televisiva, não havia narração, mas o som em "primeiro plano" de cada chute ou toque na bola. Apesar do propagado realismo, foi curioso notar o evidente artificialismo de escala, com a imagem distante, e o som em "close", talvez para aumentar a suposta imersão, mas que me deu a impressão de estar assistindo um vídeo-game. Curiosa essa influência de uma estética onde o avatar, mesmo quando distanciado e, logo, reduzido na imagem, quase sempre tem o som de seus movimentos e ações (socos, tiros, passos) amplificado e muito próximo e alto.
Após a projeção do filme, os técnicos japoneses, com a ajuda de uma intérprete, respondiam às perguntas da platéia. Juntando tudo isso, foi uma experiência muito interessante e que pode ser desfrutada por qualquer um, gratuitamente, até o dia 11 de julho,internet. Mais informações neste link: http://redeglobo.globo.com/globouniversidade/noticia/2014/05/experimente-nova-tecnologia-8k-tv-em-ultra-alta-definicao.html



3 comentários:

Unknown disse...

Muito interessante seu post e venho acompanhando esta evolução da tecnologia juntamento com o Cinema, como você falou do som 22.2, já era de se esperar até por que a Doby Digital já estava trabalhando no 11.2 e creio que muito vem por ai com as exibições em 8K.
Vamos verificar como fica este panorama no Brasil até 2016.

Leonardo Ricardo disse...

As três etapas da TV, o caminho para outra dimensão.

A TV analógica é a pioneira e é o estágio inicial da radiodifusão. Sua imagem tem pouca definição 480p, a mesma da primeira versão da TV digital em definição baixa. A TV analógica primitiva teve uma definição ainda menor que o SD

No fim do primeiro estágio e o início do segundo estágio da TV, saímos do analógico para o digital e aumentou a resolução para o full HD, embora a TV digital ainda pode levar o telespectador para a outra dimensão. O estágio intermediário da televisão inicia na resolução atual full HD e termina com a resolução 4K, que usamos nos serviços de streaming atualmente.

O possível estágio final da radiodifusão é a que chamamos de realidade assistida, ou televisão da quarta dimensão, a dimensão que se assemelha a visão humana em sua plenitude, imagens paradisíacas.
A resolução 4K é um preparo para a quarta dimensão, uma espécie de resolução antesala da visão humana, uma espécie de imersão parcial na área da visão humana. A definição 4K já trás uma sensação de realismo, mas ainda não está completa, é aí que entra o 8k.
A possível resolução final, termina enfim o abismo entre a visão humana e qualidade de imagem projetada por telas, transformando a TV numa espécie de janela para o mundo tridimensional, como se fôssemos teletransporta dos para o mundo riquíssima em detalhes, algo jamais visto antes. A nitidez da visão humana e a qualidade da imagem projetada será como céus e terra em uma mesma grei.
Se não houver a necessidade da resolução 16k pra fins Gerais, logo a TV entrará no estado "eterno. " Provavelmente o aumento da resolução chegou ao fim, logo estaremos na era da imersão profunda e total.

Jor disse...

Bastante interessante este artigo tão atual escrito em 2010
estou na era analógica em cinema ou estamos? com os recursos que são feitos e não chegam nunca
As plataformas como analisa-las? como entende-las? "Eis a questão" pra mim!!!
streaming " Nunca vi nunca comi só ouço falar" ou seja merece um artigo sobre.
Vlw Rafael de Luna