RELATÓRIO SOBRE O FORMATO DE PRESERVAÇÃO DOS FILMES DO CURSO DE CINEMA E AUDIOVISUAL DA UFF.
Prof. Rafael de Luna Freire, 10 de junho de 2013.
INTRODUÇÃO
No dia 28 de maio de 2013, reuniram-se os
professores Rafael de Luna Freire, Fernando Morais, Cezar Migliorin e Fabián
Nuñez para tratar de um projeto de preservação dos filmes realizados pelos
alunos do curso.
Entre outras questões, permaneceu a dúvida sobre
quais seriam os padrões a serem exigidos para o arquivo a ser entregue com a
versão final das produções para UFF a serem preservadas como matrizes digitais.
Uma questão que se colocou naquele momento seria a
se o codec h.264 poderia ser definido como o padrão estabelecido. Fiquei
encarregado de realizar uma pesquisa a esse respeito e o resultado dela está
nesse relatório.
AVALIAÇÕES
SOBRE CODEC E FORMATO DE ARQUIVO
Expus as minhas dúvidas em relação ao formato dos
arquivos dos filmes da UFF a serem utilizados como matrizes de preservação e
recebi vários comentários na lista da AMIA (Association of Moving Image
Archivists). Informei que estávamos pensando em padronizar a entrega dos
arquivos no codec h.264 e perguntei o que os membros da lista achavam disso.
Houve um produtivo debate, mas grande divergência de opiniões e sugestões.
Apesar de ser muito utilizado, Peter Oreckinto
sugeriu ficar longe do h.264 por utilizar alta compressão. Segundo Rod Butler, no
National Film and Sound Archive (Austrália), esse codec não é utilizado para
fins de preservação. Apesar de ser possível criar arquivos h.264 sem
compressão, isso é raramente é feito. O arquivo australiano utiliza JPEG2000,
com bit rate variável (50 e 100 MB/s). Esses arquivos são encapsulados em .MFX
e as trilhas sonoras digitalizadas em .WAV. É importante lembrar que esse
arquivo lida com longas-metragens, sendo a cinemateca nacional da Austrália.
Já Andrea Dunlap (Makani Power) disse estar tendo bons resultados com
filmes em h.264, por ser um codec comum, o que lhe permitirá no futuro ter
muitas opções para ler os arquivos.
Leo
Enticknap, do Institute of Communications Studies, lembrou que o ideal é ter a
menor mudança possível entre o material feito e o material preservado. O
formato do arquivo vai depender do formato de origem. Leo disse que seus
estudantes geralmente fazem seus projetos finais em câmeras DSLRs conectados
por HDMI em gravadores HDD que salvam o material bruto em arquivos h.264. A
pós-produção é feita geralmente em combinação de Avid Media Composer e Adobe
After Effects. No momento eles pedem o arquivo final em Blu-Ray, mas os alunos
também podem entregar os resultados em outros formatos (DVD, DCDM ou DCP) se
for necessário para inscrição em festivais.
Portanto, há muitas opções para a escolha do formato, variando de
algumas que vão consumir muito espaço, mas de maior qualidade e que são mais
seguras de um ponto de vista do software (por exemplo, AVI sem compressão),
para algumas que são menores, mas cuja qualidade da imagem e da compatibilidade
do software são comprometidas (p.e. uma imagem ISO de Blu-Ray).
Diante da minha observação de que não produzimos tantos filmes por ano e
que o volume de dados a serem armazenados não seria nosso principal problema, Leo Enticknap respondeu que
optando pelo AVI sem-compressão haveria duas vantagens: não introduzir “ruídos
digitais” resultantes da transcodificação de dois formatos de vídeo
comprimidos, e porque seu arquivo não seria comprimido usando um codec
proprietário. Desse modo, à princípio você estaria mais protegido no futuro.
O maior
problema com arquivos não comprimidos é o seu tamanho. Para NTSC em RGB não
comprimido, isso seria algo em torno de 110GB por hora, que pode chegar a quase
1TB em resolução 1980p. O h.264, embora vastamente utilizado, necessita de um
software proprietário para codificar e decodificar, e utiliza grande
compressão.
Por fim,
Leo recomenda que talvez o melhor seja fazer uma matemática de qual é o volume
de dados que seriam gerados usando tanto arquivos não-comprimidos quanto h.264
(com um perfil, nível e bitrate adequados para o seu uso), e avaliar os custos
do sua mídia preferida para armazenamento, tendo em conta os gastos regulares
para testes e migrações de mídia que serão necessários dali em diante.
Dave
Rice escreveu esclarecendo que o h.264 pode ser usado com ou sem compressão.
Certamente o h.264 comprimido é mais utilizado, mas ele pode ser encodado com
padrões iguais aos do JPEG2000, FFV1, HUFFYUV e outros codecs sem compressão. E
embora o h.264 seja proprietário, o software para codificado e decodifica-lo
não precisa ser (um deles é o x264, lançado com licença do GPL GNU).
Para
fins de esclarecimento, Josef Marc lembrou que a escolha de um codec (como
h.264) é inútil se o formato de arquivo (wrapper) se tornar ilegível. O SMPTE
sugere o .MXF e .AXF. A Apple possui o .MOV. A Microsoft meio que possui o
.AVI.
O
codec controla a qualidade do vídeo. O formato (wrapper) controla a
legibilidade.
Ele
lembrou que o h.264 é a alternativa mais comum hoje em dia a outros
sem-compressão, como JPEG2000, ProRes, DPX, DNxHD etc.
Sua
opção pessoal seria o ffmpeg-jpeg2000-mxf.
Ou seja, FFMPEG como software, JPEG2000 como codec, e .MXF como formato.
Sua opção
seguinte seria HEVC (software), h.264 (codec), .MXF (formato).
Jim
Lindner defendeu o formato AVI por ser utilizado pelo National Archives and
Records Administration (NARA), e por ser um dos primeiros formatos de vídeo
popularizados de graça por uma grande empresa (Microsoft) e por muito
provavelmente ainda poder ser lido daqui a 20 ou 40 anos.
Lindner
lembrou que diferentemente do formato (que não afeta o audiovisual em si), o
codec está relacionado com ele, mas não com o formato que o encapsula. Segundo
ele, só existem 6 codecs de vídeo sem-compressão atualmente: Uncompressed (mais
comum); JPEG2000 (DCI e Library of Congress); ffmpeg vc-1 (fonte nova e aberta);
H.264 lossless profiles (rara); AVC-Intra (mais rara); Dirac (BBC/mais rara
ainda).
NO BRASIL
Ao
enviar o mesmo e-mail para a lista da Associação Brasileira de Preservação
Audiovisual (ABPA), Marco Dreer apontou que essa questão foi muito debatida nos
encontros internacionais que ele participou. Afirmou que:
“O MJPEG2000
em tese é o formato mais recomendável, principalmente pelo fato de operar uma
compressão lossless (sem perda). No entanto, ainda que seja um formato aberto e
ISO, ele é pouco amigável,
requer investimentos altos em hardware e software, não sendo possível rodá-lo
em plataformas mais baratas e populares. Isso gerou um grande debate no
congresso, porque, se por um lado a Library of Congress defendia a adoção do
MJPEG2000 (encapsulado em um arquivo MXF), as instituições menores (incluindo a
minha, na ocasião) argumentavam que essa era uma solução fora da realidade da
ampla maioria dos arquivos, em função dos investimentos necessários.”
Eduardo
Paiva, da Unicamp, afirmou que em sua instituição eles armazenam a versão final
em h.264,
mas a edição é feita no formato nativo .MOV ou .AVI. “Editar em h.264, mesmo
com a conversão do adobe ou do final cut, acaba por ser muito demorado.”
Marco
Dreer já havia apontado que:
“o h.264
não costuma ser o codec ideal para edição, eventualmente precisando ser
convertido (é o que acontece na plataforma Final Cut, por exemplo). Mas se for
somente para armazenar o material final, já editado, o h.264 talvez seja o
codec mais adequado mesmo, para o caso da UFF.”
Marco
lembrou que além do codec, deve-se estabelecer o “formato de arquivo” (wrapper)
(AVI, MOV, MPEG, MXF etc.), uma taxa de bits fixa (que determina a qualidade do
arquivo de vídeo), além de um esquema mínimo de metadados.
Ariane
Cristina Gervásio informou que na TV UFMG os arquivos digitais são armazenados
em formato .MP4 ( H.264 - NTSC DV Alta Qualidade )
OS FILMES DA UFF
Diante
dessas questões, achei que as definições a respeito do padrão final de entrega
dos arquivos só poderia ser feita conhecendo melhor os formatos utilizados
durante o processo de produção. Agradeço às respostas dos professores Nina,
Isaac, Moreno e Cezar ao questionário que enviei. Suas respostas foram
condensadas abaixo.
Nas
produções da UFF, as câmeras mais utilizadas são Canon 5-D Mark II, que filma
em 1920x1080, em 24 ou 30 fps. O formato nativo dela é .MOV e o compressor é o
h.264.
Outras
câmeras utilizadas são a Canon T3i e Sony HVX-200, embora muitos alunos usem
suas próprias câmeras HDSRL.
A maior
parte dos filmes usam cartão Compact Flash/h.264. Outras utilizam cartão SD
classe 10, cartão P2, e fitas DVCPRO.
Além do
.MOV, outro formato recorrente é .MP4.
Os filmes
são editados em Final Cut e Adobe Premiere. Conforme Isaac, “no caso do Final Cut é preciso que os
arquivos nativos sejam convertidos para outro formato, geralmente .MPEG2 - o
Premiere faz leitura de .MOV sem conversão. A finalização, no entanto, pode
variar, mas a tendência é que eles sejam exportados em HD 1920x1080 utilizando
o h.264, o arquivo de saída pode ser também o .MPEG2 ou .AVI.”
Segundo
Cezar, os arquivos são geralmente exportados em .MPEG4 h.264 e .MOV.
Sobre o
envio para seleção, os festivais recomendam e aceitam os mais diferentes
formatos, dependendo do padrão de exibição.
Conforme
Moreno, para os festivais que ele envia, os filmes são mandados para seleção em
.AVI legendados. Para exibição, a cópia pode ser em Blu-Ray ou Betacam digital
ou analógica. “Outros ainda deixam a opção de enviar em formato de
DVCam, DCP, Blu-ray e HDCAM.”
CONCLUSÃO
Acredito
que seja preciso levar as questões acima em consideração e que a definição
sobre o padrão a ser adotada seja tomada por um grupo amplo de professores e
funcionários, uma vez que a melhor opção sobre uma decisão tão difícil é
dividir as responsabilidades sobre ela.
Creio
que esse relatório pode ser enviado a profissionais da indústria
cinematográfica e de tecnologia da informação para que eles também possam
opinar sobre as nossas opções.
Um comentário:
Interessante o relatório. Tenho alguns comentários:
- Compressão nem sempre quer dizer perda de qualidade! É muito importante que se entenda a distinção entre compressão sem perdas (lossless) e compressão com perdas (lossy). A compressão sem perdas, depois de descomprimida, resulta numa imagem identica à original (sem compressão). É importante tomar mais cuidado na hora de usar a expressão "compressão".
- H.264 não é um "codec proprietário". É um padrão desenvolvido pelo Moving Picture Experts Group (e outros). Esse grupo faz padrões muito bem definidos, pensando na interoperabilidade e no futuro. O JPEG, por exemplo, ainda é amplamente usado, mesmo tendo passado 20 anos de sua publicação. O JPEG2000 não é amplamente usado, mas também é um padrão bem definido. A tendência é que esses codecs sejam suportados ainda por muito tempo. Isso é diferente do VC1 (codec da microsoft), do VP7 (da ON2), do DivX, ou do Real Video (eca), que são codecs fechados e proprietários e que não há garantia nenhuma que continuarão sendo bem suportados no futuro.
- A mesma questão vale para o formato. O AVI é um formato bastante usado e que permite colocar quase qualquer codec (com gambiarras incríveis), mas é um formato com sérias limitações e que não foi projetado pensando no futuro. Padrões bem definidos novamente são a melhor escolha (como mp4 ou mxf).
- E o áudio, como fica? =). Tá certo que não ocupa quase nada de espaço em comparação ao video, mas uma compressão sem perdas (com flac, por exemplo) não faria mal.
- Por último, tem que se levar em conta que a distribuição dos filmes não precisa ser feita no formato de preservação. Preserve em padrões que vão ser bons por muito tempo e distribua no formato mais apropriado para cada momento que for necessário.
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